Pagando o terceiro maior salário do Executivo municipal, funções transformaram-se em alvo de cobiça política no Legislativo e no Executivo

Carlos Eduardo Reche

Os altos salários pagos aos coordenadores da principal câmara técnica do Plano Diretor de Goiânia – R$ 4.030,00, o terceiro maior vencimento do Executivo – transformaram o órgão em alvo de cobiça política no Legislativo e no Paço Municipal.

Criadas para servidores com conhecimentos específicos em urbanismo, segundo a lei complementar nº 171, as funções da Câmara Técnica de Planejamento foram ocupadas por parentes de vereadores, ex-auxiliares de primeiro escalão do prefeito Iris Rezende (PMDB) e até um ex-vereador.
Entre os nomeados estão a mãe do presidente da Câmara de Goiânia, Deivison Costa (PT do B), Eny Rodrigues da Costa; o irmão do vereador Clécio Alves (PMDB), Ricardo Alves Deodato; e o filho do vereador Izídio Alves (PMDB), Eduardo Borges de Souza.

O ex-secretário de Turismo Waldomiro Dall’Agnol, o ex-presidente do Banco do Povo Márcio Santana de Abreu e o ex-presidente do PMDB de Goiânia Emival de Oliveira Santos integram a relação. Completam a relação Valéria Gomes de Lima Martins e o ex-vereador José Valter Soares Santos.

As nomeações não estão de acordo com o que estabelece a lei complementar do Plano Diretor, de 29 de maio de 2007. O artigo 180 do código diz que metade dos 16 cargos da Câmara deveriam ser ocupados por servidores de carreira da Prefeitura.

Regras

Pelas regras, dos nove coordenadores técnicos da Câmara de Planejamento, cinco deveriam ser preenchidas por servidores efetivos e quatro por comissionados. A Secretaria do Planejamento confirma que todos os oito coordenadores nomeados são comissionados e foram escolhidos por meio de critérios políticos.

A lei complementar do Plano Diretor cria quatro câmaras técnicas: além da de Planejamento, a de Áreas Públicas e Regularização Fundiária, a de Uso e Ocupação do Solo e a de Parcelamento do Solo. Os órgãos são o embrião do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Goiânia (Ippug). Mas apenas a Câmara de Planejamento tem nove cargos de terceiro escalão: as demais têm apenas um coordenador com salário de R$ 4.030,00. As câmaras pertencem à estrutura da Secretaria do Planejamento.

Os coordenadores da Câmara Técnica de Planejamento nomeados por meio de indicação política ocupam vagas que seriam destinados aos servidores efetivos que trabalharam meses na elaboração da proposta do Plano Diretor, aprovada em abril pelo Legislativo. Entre os nomes estão doutores em urbanismo formados em renomadas universidades do exterior, como Harvard, nos Estados Unidos.

Aos melhores especialistas no setor restaram as outras câmaras técnicas – menos importantes hierarquicamente – e as assessorias técnicas da Câmara de Planejamento – quatro das sete já estão preenchidas – com salários de R$ 1.835,00.

Juntos, os cargos já preenchidos custam R$ 39,5 mil aos cofres da Prefeitura – 81,5% desse valor é gasto com os salários dos servidores sem formação específica indicados politicamente.

Na frente

A primeira nomeação foi a da mãe do presidente da Câmara, por meio do decreto número 1.961, publicado na edição 4.209 do Diário Oficial do município, em 21 de setembro deste ano. Ricardo Deodato, irmão de Clécio, foi nomeado em 30 de outubro (decreto número 2.234) com publicação no Diário Oficial de 1º de novembro. A nomeação mais recente entre os comissionados indicados por vereadores é do filho de Izídio, Eduardo de Souza, em 21 de novembro (decreto 2.467).

Dall’Agnol e Emival foram conduzidos à Câmara Técnica em 26 de novembro e Márcio Abreu, no dia 28 de setembro.

Critérios políticos

Secretaria do Planejamento sugere os nomes, mas a decisão final não é nossa”, disse. “Não conheço os critérios usados nas nomeações”, afirmou. As nomeações são assinadas pelo prefeito e pelo secretário de Governo, Jairo da Cunha Bastos.

O vice-prefeito Valdivino de Oliveira (PMDB) também reconhece o uso de critérios políticos na escolha dos coordenadores da Câmara Técnica de Planejamento, mas disse que as nomeações não passaram pelo seu crivo, nem mesmo no caso dos vereadores. O vice acumula a função de articulador político de Iris na Câmara de Goiânia.

“As nomeações são feitas segundo todas as facções políticas, todos os partidos que compõem a Prefeitura. É claro que se foi nomeado, foi indicado por alguém”, disse o vice-prefeito.

Fontes na Câmara atribuíram a ele a nomeação de Valéria Martins, mas funcionários do gabinete do vice e ele próprio afirmaram que não conhecem a coordenadora.

Explicações diferentes para indicações
Os vereadores que indicaram parentes para coordenações da Câmara Técnica de Planejamento do Plano Diretor defenderam as nomeações ontem. A mãe do presidente da Câmara, Deivison Costa (PT do B), Eny Rodrigues da Costa, o irmão do vereador Clécio Alves (PMDB), Eduardo Alves Deodato, e o filho de Izídio Alves (PMDB), Eduardo Borges de Souza, respectivamente, foram nomeados para as funções, com ganhos de R$ 4.030,00 mensais, em setembro, outubro e novembro deste anopor meio de decretos do Poder Executivo.

Deivison disse que não comentaria a nomeação da mãe, mas citou as escolhas de parentes de outros vereadores para postos no Executivo. “O (vereador) Bruno (Peixoto) tem o pai (Sebastião Peixoto, presidente da Companhia de Obras), o (deputado estadual) Samuel (Belchior) tem o pai (Lauro Belchior, presidente do Instituto de Previdência dos Servidores) e ninguém questiona. Que é que tem isso?”, questionou o presidente da Câmara de Goiânia.

Clécio Alves disse que a nomeação do irmão, Ricardo Alves Deodato, para outra coordenadoria partiu do prefeito Iris Rezende (PMDB). “A indicação é do prefeito, é ele quem nomeia”, afirmou o vereador. Ricardo Deoato foi diretor de Emprego e Renda da Fundação Municipal de Desenvolvimento Comunitário (Fumdec). O peemedebista disse não saber qual a formação do irmão.

O peemedebista disse ainda que o irmão está fazendo um curso superior, não sei se é de Pedagogia”, afirmou, “e vai ainda assumir outra função a ser definida pelo prefeito, porque a câmara se reúne periodicamente, mas poucas vezes”.

Trabalho diário

Na Secretaria do Planejamento, a informação dada ao POPULAR é de que o trabalho é diário, de segunda a sexta-feira. As câmaras técnicas do Plano Diretor estão instaladas em três salas da Secretaria do Planejamento, no 1º andar do anexo 1 do Paço Municipal.

O também peemedebista Izídio Alves afirma que seu filho, Eduardo Borges de Souza, que é administrador de empresas, tem o preparado exigido para a função. “A decisão (da nomeação) foi do prefeito, pelo nosso companheirismo, pela nossa lealdade”, afirmou o vereador, em referência ao apoio dado ao prefeito nas votações na Câmara de Goiânia. “Não pode ser só no ‘ban, ban, ban’, (a nomeação) tem de ser dentro da lei”, completou peemedebista.

Nomeação com data retroativa

O ex-vereador Valter Soares (legislatura 2001-2004) saiu em vantagem nas nomeações para as coordenações da Câmara Técnica de Planejamento do Plano Diretor: enquanto os outros sete conduzidos à função foram efetivados na data do decreto, a nomeação do pastor evangélico, eleito pelo PR (à época PL) em 2000, foi retroativa a 31 de julho deste ano.

Assim, Soares recebeu quase três salários a mais pela função, totalizando R$ 12.090,00 – quase o salário do prefeito Iris Rezende, que é de R$ 12,5 mil. O ex-vereador foi nomeado por meio do decreto número 2.111, de 28 de setembro, com publicação no Diário Oficial de número 4.219 do Município de Goiânia, de 5 de outubro de 2007.

Antes de ser nomeado para a Câmara Técnica de Planejamento, Valter Soares passou pelas diretorias Financeira e de Assistência Social da Fundação Municipal de Desenvolvimento Comunitário (Fumdec), extinta pela reforma administrativa aprovada pelo Legislativo a pedido do prefeito em 31 de maio deste ano.