Urnas testam o Planalto
Desavenças na base aliada e crise econômica podem complicar planos da presidente nos próximos meses e estratégia de possível reeleição
Juliana Braga
A presidente Dilma Rousseff tem um segundo semestre delicado pela frente, sendo o ponto principal os possíveis desgastes nas eleições municipais de outubro, decorrentes da divisão da base aliada do governo. Aliado a crises da seara econômica, os percalços políticos podem causar danos ao Planalto. Uma economia em resfriamento, greves generalizadas e uma base de apoio fragmentada e insatisfeita são os principais desafios do governo, segundo especialistas, com vistas à reeleição de 2014. Cientistas políticos ouvidos pelo Correio concordam que este é o momento de Dilma plantar as sementes da reeleição e tentar frear a crise que se aproxima de seu governo.
Para o especialista em direito eleitoral Flávio Britto, o complicado jogo das eleições municipais está no plantel de preocupações de Dilma. Apesar da tentativa de restringir sua participação nas campanhas para evitar complicar ainda mais a relação com a base insurgente, a presidente não poderá se furtar de contribuir com o pleito de aliados em cidades importantes. "Cidades onde se tem PT, PMDB e PSB brigando, evidentemente, ela vai ter que atuar com uma moderação maior porque não pode criar atrito com a base. Mas, se ela ignorar cidades grandes, como Juiz de Fora e Ribeirão Preto, que influenciam em uma campanha presidencial, é um tiro no pé", avalia. Segundo o especialista, as eleições em outubro seriam capazes de garantir a ela uma base para apoiá-la na reeleição.
O freio na economia, que sempre foi a obsessão da presidente e que tem sustentado sua popularidade, também deve ser um ingrediente de preocupação e, fatalmente, resultará em maior pressão dos aliados por repasses para bases eleitorais. "É muito difícil que a crise internacional afete o PIB e não afete o emprego e a renda das pessoas. Em longo prazo, é uma situação complicada. Tudo isso, se gerar um sentimento de paralisia ou da incapacidade de dar boas respostas, pode afetá-la", avalia o coordenador do curso de Ciência Política da AEUDF, Leonardo Barreto.
Paralisações
As greves no setor público são um reflexo desse nó econômico do Brasil. Na avaliação do especialista, a reclamação dos servidores não é fruto de baixos salários e sim do medo de se voltar ao modelo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que segurou com mão de ferro os reajustes do funcionalismo público. "Mais complicado do que não ter direitos é ter conquistado eles e vê-los ameaçados. Essas greves pipocando não são em virtude de salário, porque as categorias tiveram recomposições importantes, mas é um receio forte de que o padrão de correção desses salários volte para a era (Fernando Henrique Cardoso) FHC", pondera.
Outra preocupação será aprovar projetos importantes com uma base fragmentada, insatisfeita e em ano de recesso branco. "Manter partidos que têm linhas totalmente distantes dentro da base governista, atender todos esses parceiros, que às vezes são divergentes — a maioria clientelista, fisiológica", avalia o cientista político da Universidade Brasília Ricardo Caldas. Na pauta do Congresso estão a medida provisória que preenche as lacunas do veto da presidente ao Código Florestal e a do Brasil Maior, que ainda precisa ser aprovado no Senado.
Dilma terá de lidar com essa dificuldades se quiser pleitear a reeleição. Para Flávio Britto, uma possível queda na popularidade seria um ônus natural de quem ocupa um cargo no Executivo. Na visão de Leonardo Barreto, Dilma chegou a uma encruzilhada, por causa de ser o fim de um ciclo de crescimento econômico, em que terá de escolher entre endurecer nas medidas sociais para manter a economia em dia ou ceder e arcar com os ônus de uma economia não tão estável.
Principais desafios
Dilma terá de enfrentar dificuldades para não minar possibilidades em 2014
Economia
O PIB, cuja previsão de crescimento chegava a 4,5% no início do ano, não deve chegar a 2%. Efeitos podem impactar na renda e na geração de empregos para a população.
Greves
As paralisações dos servidores federais já duram quase dois meses. O governo tem pequena margem de negociação e categorias não querem ceder.
Base insurgente
Grande e fragmentada a base pode gerar dificuldades na aprovação de projetos importantes, como a medida provisória do Código Florestal e o Brasil Maior. Também complicam a participação de Dilma nas campanhas em outubro.
FONTE: CORREIO BRAZILIENSE, sábado, 28.07.2012