Embora se tratando de sindicato representativo de servidores federais, a Diretoria do Sinjufego, reunida na manhã de hoje, 17/08/2013, repudia as medidas do governo de Goiás que atentam contra o livre exercício do direito de greve do servidor público estadual. O decreto viola legítimo direito constitucional e exorbita em legislar sobre matéria de competência federal. Trata-se de uma aberração jurídica sem tamanho.
A Diretoria do Sinjufego
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Greves
Decreto torna punição imediata
Texto publicado no Diário Oficial do Estado prevê corte de ponto de efetivo e demissão de comissionado
17 de agosto de 2013 (sábado)
A partir de agora, o servidor público do Estado que participar de greve, paralisações ou operações de retardamento administrativo terá, automaticamente, o ponto cortado nos dias de paralisação e responderá a processos administrativos. No caso dos comissionados, haverá exoneração imediata. Ocupantes de cargos de confiança ou gratificados serão dispensados. É o que prevê o Decreto nº 7.964, publicado no Diário Oficial do Estado em suplemento da edição do dia 14 de agosto, que estabelece uma série de medidas administrativas a serem tomadas pelo Estado em caso de paralisações.
Em análise prévia do conteúdo do decreto, tanto representantes do Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO) como da Ordem dos Advogados do Brasil, seção Goiás (OAB-GO), identificaram indícios de inconstitucionalidade que coíbem o direito de greve do trabalhador. O coordenador do Centro de Apoio Operacional (CAO) do Patrimônio Público, promotor Rodrigo Bolleli, informa que o MP vai instaurar procedimento para estudar o texto e decidir qual medida tomar. “A princípio, em análise preliminar, o decreto seria inconstitucional, porque não cabe ao governo discorrer sobre o direito de greve e, além disso, fere esse direito ao impor punições”, diz.
Em conformidade a esse posicionamento, o presidente da Comissão de Direito do Trabalho da OAB-GO, advogado Jorge Jungmann Neto, diz que o decreto incide sobre o direito de greve e que a regularização generalizada de punições, de certa forma, legaliza a pena e torna ilegal o direito previsto em Constituição. Da forma como o texto foi exposto, apesar da nota técnica de explicação, não ficou claro para Jorge a conotação que o Estado deseja dar à medida. “Se a intenção era apenas normatizar o que já existe em lei, isso não ficou claro. Há ali, pelo visto, uma tentativa de coibição do funcionalismo de não aderir às greves”, expõe.
O chefe da Casa Civil, Vilmar Rocha, falou com o POPULAR e defendeu que o decreto não traz nada de novo e que, somente, normatiza de maneira clara e direta o que já existe na legislação nacional. Segundo ele, havia muita divergência entre as secretarias sobre quais medidas tomar em situações de greve e que, agora, o decreto explica bem o que pode e o que não pode ser feito. “Repercutir isso é querer esquentar algo considerado absolutamente normal no âmbito da administração pública. É um assunto corriqueiro, mas que geralmente é tratado com excesso de politização. Tudo que está no decreto, está na legislação, só que de maneira esparsa. Agora foi especificado”, argumenta.
AÇÕES
O MP-GO vai dividir os trabalhos em duas esferas. Além do CAO Patrimônio Público, a chefia da instituição também deve tomar algum posicionamento e instaurar ação própria. “Isso pode gerar eventual Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI)”, afirma Bolleli. Para o promotor, também existe uma tentativa clara de intimidação dos servidores, na maneira como o decreto foi feito, e ele acrescenta que não se pode punir grevistas, se não houver julgamento de que o ato é ilegal, e isso deve partir do Judiciário, não do Executivo.
Bolleli concorda com o argumento expresso pelo governo estadual na nota técnica de que a legislação atual é mais voltada para o setor privado e que falta uma atualização da legislação para greves do funcionalismo público. Mas ele contrapõe que, enquanto isso não for feito e a lei atual estiver valendo, o simples fato de exercer o direito de greve não é ilegal e, portanto, livre de tentativas de coibições e punições. Sobre isso, Vilmar Rocha, reforça: “Tudo que está no decreto, está na legislação. Pode ser feita a greve, mas as punições também já são previstas na lei”.
Um dos argumentos utilizados pelo governo na nota técnica que acompanha o decreto, é que existe hoje uma situação de “mora jurídica”, ou seja, de ausência de atualização ou criação de uma lei específica para tratar de greves no funcionalismo público. A lei vigente (n° 7.783, de junho de 1989), dispõe sobre o exercício do direito de greve e define as atividades essenciais para a população e que precisam de atenção especial ao se decidir por iniciar uma paralisação. Nos Artigos 12 e 13 são expressados que o poder público tem de assegurar a prestação dos serviços indispensáveis e que, em situações de greve, ficam as entidades sindicais ou os trabalhadores obrigados a comunicar a decisão aos empregadores e aos usuários com antecedência mínima de 72 horas
Revolta e irritação de servidores
O decreto que trata da questão das greves foi recebido com sentimento de revolta e irritação pelos servidores. O presidente do Sindicato dos Servidores Públicos de Goiás (SindiPúblico), Thiago Vilar, define a iniciativa como uma intimidação aos trabalhadores e considera que ela, nada mais é, que uma demonstração de que a relação entre chefe e empregado está bastante desgastada, ao ponto de suscitar decisões tão radicais.
O governo deve sofrer questionamentos na Justiça. Assim como o Sindipúblico, o Sindicato dos Policiais Civis de Goiás (Sinpol-GO), que pretende realizar nova paralisação na terça-feira, vai protocolar ação questionando a constitucionalidade do ato. O presidente da entidade, Silveira Alves de Moura, classificou a atitude como uma aberração jurídica e que, diferentemente do que defende o governo, o decreto discorre, sim, sobre o direito de protestar, o que não é de competência do Estado. Vilmar Rocha contrapõe que o servidor poderá entrar em greve e que o decreto não entra nesse ponto, mas que as punições serão aplicadas de acordo com a lei. “Elas não são ameaças ao servidor”, considera.
Sindicato aponta inibições
Um ponto polêmico do texto do decreto é sobre a medida que será tomada em caso de comissionados, ocupantes de cargos de confiança ou gratificados que ingressarem nas greves. O início do artigo é claro: “Serão imediatamente exonerados...” Apesar da dificuldade de encontrá-los em paralisações, em razão do tipo de vínculo empregatício e da, geralmente, estreita relação política, os sindicatos das categorias entendem que isso não deixa de inibir a possibilidade deles poderem lutar pelos seus direitos, enquanto empregados comuns. No que se refere aos servidores efetivos, o procedimento, antes de uma possível exoneração, terá de obedecer os trâmites internos, com abertura de processo administrativo e investigação individual dos casos.
O que tem sido comum nas greves em Goiás, além do aviso e da realização de assembleias das categorias, é o acordo jurídico de que parte do serviço deve continuar em funcionamento. No último caso, que envolveu a Polícia Civil, por exemplo, 70% paralisaram e 30% continuaram trabalhando para não interromper totalmente a prestação do serviço e cair na ilegalidade. O texto do decreto não especifica se as punições serão aplicadas somente quando a greve for considerada ilegal. Deixa em aberto e subentendido de que em todos os casos isso será feito, podendo os dias cortados do ponto trabalhista serem ressarcidos após acordo entre a categoria e o governo.
“Partiu de uma provocação do secretário de Segurança Pública”
O procurador do Estado com atuação na Casa Civil e autor da norma técnica que acompanha o texto do decreto no Diário Oficial, Rafael Arruda Oliveira, defende a tese de que nada de novo está sendo implantado, porque a lei atual já prevê o que está definido no decreto, e informa que os sindicatos não chegaram a ser ouvidos pelo governo.
Por que o decreto foi feito só agora, a um ano da eleição e quase no fim do governo?
Era necessária a edição de um ato sistematizador e orientador para os demais órgãos da administração. Embora tivesse previsão em lei, às vezes um determinado secretário adotava, mas outro não. Esse decreto dá um pouco mais de forma a essas medidas e atribui obrigações aos chefes das pastas.
Quando a assessoria jurídica da Casa Civil começou a elaborar o decreto?
Os estudos começaram há um mês pelo menos, com ampla análise de julgamentos anteriores do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que têm verdadeira jurisprudência a respeito, principalmente, do corte dos pontos trabalhistas. O tribunal do STJ, por exemplo, é unânime na necessidade de corte de pontos.
Foi o governador que pediu esse estudo?
Não. Esse estudo é fruto de demandas de órgãos do Estado. Partiu, em primeiro momento, de uma provocação do secretário de Segurança Pública e envolveu não só a Casa Civil, mas a Procuradoria-Geral do Estado e a Secretaria de Gestão e Planejamento (Segplan) também.
Os sindicatos foram ouvidos ou procurados para discutir isso?
Não. Eles não foram ouvidos, até mesmo porque não está sendo feito nada novo. O governo editou um ato normativo sistematizando medidas administrativas a serem adotadas em caso de greve. Foi isso.
Fonte: Jornal O Popular, sábado, 17/08/13.
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